28.7.06

O retorno - 3

(O cenário é uma simpática vila nas montanhas, com simpáticos moradores. Ao invés de casas em estilo neoclássico ou gótico, há rabiscos pelo chão simbolizando o contraste "espaço público/espaço privado" - ou seja, delimitando as casas. Ouvem-se tiros e uma moça entra correndo na cidade, encontrando um morador enrustido que se passa por intelectual de botequim. O rapaz esconde a moça numa mina que nunca produz nada e é dotada de iluminação natural. Um carro aparece com as janelas tapadas por cortinas. Pára ao lado do morador da vila. O motorista fala com ele:)
_Viu uma moça passar por aqui?
_Moça? Quer dizer, uma mulher?
_De preferência.
_Não, nunca vi não.
(Silêncio constrangedor. O homem no banco ao lado do motorista solta um suspiro angelical enquanto dá polimento à sua M16. O residente da cidade solta a pérola:)
_Foram os senhores que dispararam aqueles tiros?
_Caçávamos galinhas. E não pergunte mais nada.
(Ouvem-se batidas na parte de trás do carro.O motorista diz ao assustado morador:)
_O chefão quer falar com você. Vai.
(Ele vai. O vidro abaixa um pouco. A voz em off do Apocalipse diz:)
_Se vir a menina, ligue para mim.
(Entrega um cartão ao morador.)
_Posso lhe dar uma boa recompensa.
(O rapaz estremece com a oferta. Reluta um pouco mais aponta para a mina. O carona sai do carro, vai até o local e arrasta a mulher pela rua única da cidade, até de volta ao carro. O rapaz recebe um bom dinheiro. O carro vai embora. A cidade continua como sempre. Fim.)
Se fosse assim, pouparia-nos 3 horas. Se fosse assim, não haveria tantas teorias sobre a proposta do filme. Se fosse assim, umas 20 vidas teriam sido poupadas. Se fosse assim, não teríamos Dogville. Ainda bem que o Trier fez o roteiro, e não eu.
Originalmente publicada em www.porradaneles.zip.net, em 20/02/2005
Só porque gostei muito de Dogville.