30.9.08

Voltando e voltando.

Nada como ausentar-se por um tempo para pôr em dia, no devido dia, as novidades. Detesto o cotidiano, quando tratado com simplicidade. Atos e fatos passados sem qualquer significância, sem qualquer cortejo ou ritual que lhes dê a devida atenção. Vão se os dias e já é dezembro, e ainda há cara-de-pau suficiente para lamentar-se: oh, chegou tão cedo! Hipocrisia um tanto inocente, esta com que tratamos o irrelevante.
O modo como se trata o irrelevante expressa quem somos melhor do que nossas grandes atitudes. O irrelevante, o comum, o ordinário é aquilo que consideramos nosso oposto. Nada é pior tratado por nosso verdadeiro eu do que nosso oposto. O contrário. Aquilo que nos esforçamos para cortar relações. Levamos uma vida inteira esforçando-nos para provar a todos que esse irrelevante, esse contrário, esse repugnante são nos pertencem, não são resultado de nós, não temos ligação alguma com eles.
Perigoso pôr tudo no mesmo saco de gatos: o irrelevante, o contrário, o repugnante. Todos merecem nossa mesma inatitude. São diferentes em essência, claro. Mas o tratamento é semelhante.
Prestar atenção, eis o clichê. Banal, mas vende muito como auto-ajuda. A toalha jogada, a tampa levantada, o beijo que foi no rosto (e por quê?), as mãos não dadas, distância maior que um abraço, ligação no aniversário, coisas do cotidiano, do comum, do banal. E tão fundamentais.
O comum, o banal, não merece nossa atenção. Nem deveria. Mas o banal para uns é o fundamental para outros. E ainda assim atropelamos todos os atos, todos os fatos sob a mesma bandeira da irrelevância. Como moscas. E se pisarmos num inseto que representa o mundo para alguém?
O comum é o planejado. Tudo segundo o plano. Toda uma vida presa, uma vida definida. Sair dos trilhos é considerado exceção. Toda uma vida planejada, minuciosamente planejada. E, no fim, é o inesperado que lhe confere algum significado.