19.6.07

O Partido, a Chapa, o Poder.

A construção de uma hegemonia de partido sobre as demais esferas da sociedade pode ser aplicável em qualquer universo, não importa o quão pequeno ele seja. Numa universidade, por exemplo, o caso que presenciei hoje foi sintomático.
A ocasião era um debate entre duas chapas para o DCE (Diretório Central dos Estudantes) da dita universidade. Beleza. Lá pelas tantas, me atira a pérola um sujeito da Chapa 2:
"Vocês (os alunos; dirigia-se o sujeito à platéia) querem participar das dicussões, debater, ou ser massa de manobra? Querem participar do movimento estudantil ou se deixar levar pelos outros?"
O sujeito não falou nessas palavras, é certo. Minha cabeça não é gravador. Mas o sentido foi esse.
Interessante o sentido dessas palavras. Constituem símbolo maravilhoso do quanto um sentimento ou opinião de grupo pode chegar a esmagar as opiniões de grupos contrários a ele.
A colocação do sujeito é dicotômica: ou você participa, ou é massa de manobra. Não há espaço para meio-termos; não há lugar para "terceiras-vias". O camarada é A ou B, lá ou cá. Não há intermediários entre o iluminado e o ignorante.
Ao colocar as coisas desse jeito, universalizando uma idéia que é apenas do grupo a que o dito sujeito pertence (ou, talvez, uma idéia que é própria e única apenas a ele mesmo); ao descrever o mundo em tão preto-e-branco, o sujeito nada mais faz do que delimitar os espaços onde supostamente pode haver contestação e onde supostamente são válidas as manifestações e a participação. Se um camarada resolve não discutir reforma universitária junto a outros colegas da universidade, imediatamente se torna massa de manobra, iludido, manipulável. Os mecanismos onde pode haver resistência são cuidadosamente definidos por um Partido (ou, no caso, uma Chapa de DCE) e os espaços fora desse limite são identificados com os inimigos. E inimigos, bem se sabe, ou se exclui ou se pune.
As propostas dessa Chapa começavam sempre por "diálogo com os alunos da universidade". Beleza. Muito lindo. Mas ao separar o universo em manipulados e iluminados, essa mesma chapa exclui outras formas de diálogo que não as dela própria. A conversa e a iluminação se dão nos moldes definidos pela chapa, o "falar" e o "ouvir" se dão enquanto espaços legítimos dentro dos limites da chapa. Em resumo, resistências que repudiem a discussão em assembléias estudantis (seja porque estejam desiludidas com o movimento estudantil, seja porque acham discussão uma perda de tempo) são desconsideradas enquanto resistências. São identificadas com a "massa de manobra", que inevitavelmente leva ao "conservadorismo", logo associado à "direita", por fim banido sob pretexto de "reacionário".
Acho odiosa a forma como organizações identificadas com o sentido do Partido agem. O Partido deveria ser integrador, crítico, promotor de discussões. Mas quando a organização define o encaminhamento do debate sem ouvir os críticos (quem precisa ouvir "massas de manobra"), ou os ouve, porém ignora, imeditamente se perde em muito o caráter democrático de deve ser a organização dita política. Infelizmente, estamos num espaço de luta por hegemonia. Não por melhorias.

1 Comments:

Blogger O Professor said...

Obrigado pela visita, João,
grande abraço!

21 junho, 2007 19:01  

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