3.1.08

Um conto que eu ia mandar prum concurso.

Ninguém lê isso aqui, mas eu escrevo assim mesmo. O texto abaixo é um conto que eu ia mandar prum concurso da UFF, mas não mandei. O tema era "Aconteceu na UFF". Fiz uma historinha bem bobinha. Enfim... O nome é "Do Planejado ao Planejar".
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Aconteci na UFF. Foi ocasião de tamanha discrição que até pensei, por um momento fugaz, tratar-se de evento corriqueiro. Não era, logo ficou claro. Aconteci como eventos de grande magnitude acontecem. Um pequeno abalo, um incômodo que logo se transforma em dura convicção, um pensamento que se transmuta em ação, um grilo que se metamorfoseia grifo escandalizado, grito sufocado que irrompe num segundo de distração, quando a pretoriana guarda de meus preconceitos se distrai.
Aconteci num momento banal de aula nada-banal. Olhando pela janela a grama descuidada, os movimentos de pipa a riscarem o céu ao fundo. Olhando pela outra janela a baía que se pretende cristalina, em cuja superfície deitam os raios do sol da manhã. Olhando à frente, professor de giz na mão, arranhando o verde quadro em traçados empolgados. Olhando ao fundo os colegas distraídos, alguns em cochilo, todos atordoados.
Aconteci em multidão, em conjunto. Acontecemos. E havia pouco estávamos ali, naquela mesma sala, planejando o futuro numa terça-feira travestida de sexta, que enganava nossos sentidos e nos convidava à seresta. Acontecemos num evento que mudaria nossas vidas e outras vidas.
O palco, uma sala de aula. Atores improvisados improvisando um novo ato. Bandeiras, tintas, palavras reunidas de modo a dar sentido àquela transformação, àquele acontecimento. Lutas. Mais bandeiras. Caminhadas. Gritos, canções. Luta desarmada, mas com corações comprometidos. Ações que têm sentido não apenas para os que lutam, mas para os que enxergam. Para os que são tocados, levados ao movimento da história, à roda, à novidade.
Ao acontecimento.
Aconteci e “acontecei” outros. Vários acontecemos. O que começou devagar, como um sussurro que se desprende timidamente das garras da opressão individual, é materializada em libertação coletiva. O sussurro que chama à vida, à transformação da vida e das coisas da vida.
Coisas? Que coisas? Não sei, sei da mudança. Sei que algo há de melhor além dos muros. Nas aulas de história refletia-nos o vazio. Surgi. Surgiu um ambiente. Surgiu uma idéia. Gragoatá ficou pequeno, os gramados tão pequenos, a biblioteca pequena. No campus não cabíamos. Eis o sussurro, ainda o mesmo, não mais o mesmo, berrando aos quatro cantos do lá fora, do detrás dos portões, fora das grades do estacionamento, depois da sala de aula, além das aulas presenciais. Quatro cantos desse vasto mundo.
Mundo mundo, vasto mundo. Não é uma rima, é uma solução. Avante com a idéia. A bandeira tremulando nas mãos. Ao amanhã. A ele a gente não diz, a gente exige. De nós e da vida, a vitória! Avançar...
De volta ao lar, doce lar. Hoje professor. As aulas? De história. Hoje num futuro não tão distante, imagino. O sussurro? Vai bem, obrigado. Foi-se ao mundo. Deixou um recado: não me esqueça. Mas me espalhe. Mas me anuncie. Não me cale. Não deixe de acontecer. E o que daí surgir, comente. Mande uma carta. Mas não avise. Deixe acontecer, deixe despertar.
Aconteceu na UFF. Foi ocasião de tamanha discrição que até pensaram, por um momento fugaz, tratar-se de evento...